(Artigo Tribuna das Ilhas - 21/10/2011)
O Primeiro-Ministro apresentou ao país o mais gravoso Orçamento de Estado de que há memória desde o 25 de Abril! O mais agressivo para as famílias e empresas, o mais oneroso para os funcionários públicos, o mais ofensivo para os reformados. Um orçamento que, segundo as contas do Governo, irá provocar níveis recorde de recessão e desemprego no ano de 2012.
De entre as medidas anunciadas, muitas delas com um forte cariz neo-liberal, destacamos, o fim do subsídio de Natal e de férias para a função pública e pensionistas (no mínimo durante dois anos), o aumento do IVA de grande parte dos produtos da taxa média para a taxa máxima, o aumento do horário de trabalho no sector privado para mais 30 minutos por dia, limites para as deduções de despesas de saúde e de habitação em sede de IRS, reduções drásticas no orçamento do sector da saúde e educação, privatizações ao desbarato e ainda subidas de quase todos os impostos.
Aqueles que agora impõem estas medidas são os mesmos que fizeram cair o Governo anterior, referindo que os portugueses não suportavam mais cortes nos seus salários e pensões.
Em Maio de 2011, antes das eleições nacionais, perguntava Passos Coelho ao País, "Como é possível manter um governo em que um Primeiro-Ministro mente?"
Durante a campanha eleitoral ouvimos Passos Coelho defender que não se podia aumentar a receita, aumentando mais impostos, que o Estado tinha de dar o exemplo, que eram sempre as famílias e as empresas as mais penalizadas, ou então, os funcionários públicos, aqueles que não têm como fugir aos cortes. Dizia ainda que os sacrifícios eram geridos sem justiça e equidade, que o reequilíbrio orçamental não deveria ser atingido à custa da receita fiscal, que com um Governo PSD não haveria mais ataques à classe média. Afirmava que não bastava um plano de austeridade que cortasse cegamente, que acabar com o 13.º mês era um disparate e garantia que um ajustamento fiscal incidiria sempre nos impostos sobre o consumo e nunca agravaria os impostos sobre o rendimento. Declarou mesmo “Comprometo-me perante os Portugueses a não cortar mais salários”.
Querem mais exemplos? Ou estes chegam para atestar e avivar o conceito de mentira?
O denominado "buraco colossal" agora encontrado nas contas de 2011 e que está a ser utilizado como desculpa para o Orçamento de 2012 tem de ser explicado.
O 1.º Ministro acena com a ideia de que as medidas de austeridade do Orçamento de 2012 são suas, mas que apenas serão impostas devido ao défice já existente, fazendo passar a ideia que o desvio agora encontrado é da responsabilidade do Governo anterior.
No entanto, a própria Comissão Europeia veio já desmentir o Primeiro Ministro, afirmando que o desvio das contas em 2011 se deve aos acontecimentos na Madeira e a um contexto de travão na actividade na Europa que, afecta, naturalmente, a economia portuguesa.
As medidas de austeridade introduzidas pelo Orçamento de Estado para 2012 vão muito para além do acordo firmado com o Troika. As medidas constantes desse acordo eram suficientes para compensar as dívidas dos governos anteriores. Tal como a advertiu a Comissão Europeia, é efectivamente necessário aplicar medidas de austeridade, mas de uma forma inteligente e que não prejudiquem o crescimento. Exactamente o oposto do que se vê neste Orçamento de Estado.
Já todos sentimos no nosso dia-a-dia os efeitos da austeridade. Mas tenho uma sensação de "dejá-vu", perante a realidade. Onde é que já vimos isto? Tanta austeridade que levou ao completo colapso da economia? Queremos que Portugal seja uma 2.ª Grécia?
Onde estão as medidas para a revitalização económica? A saída deste buraco faz-se através de um crescimento económico, que tem de passar necessariamente por uma reforma estrutural, consolidando as contas públicas e introduzindo medidas geradoras de emprego.
Todos sabemos que é difícil, era óbvio que nada disto se ultrapassaria sem mais medidas de austeridade, mas nunca esperaríamos que fosse apresentado um Orçamento de Estado tão castrador e sem se dizer uma palavra quanto ao crescimento económico!
"Há limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos", dizia o Presidente da República em Março de 2011.
Nesta, e apenas nesta, concordo com Cavaco Silva!
Horta, 18 de Outubro de 2011