quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Constituição, para que serves?

Artigo Tribuna das Ilha (18/01/2013)

Na Faculdade de Direito aprendemos que a Constituição da República Portuguesa é a Lei Fundamental do País. Desde lá, até algum tempo atrás, acreditei piamente nesse fato que me ensinaram.
Aprendi ainda que o Tribunal Constitucional, tribunal ao qual compete administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional, estava no topo da nossa hierarquia judicial, sendo que as suas decisões eram obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas, prevalecendo sobre as dos restantes tribunais e de quaisquer outras autoridades, na sua qualidade de garante da Constituição.
No entanto, de há uns tempos a esta parte, começo a ter sérias dúvidas quanto à veracidade desses ensinamentos.
Um dos princípios fundamentais plasmados na nossa Constituição é o princípio da igualdade, que estabelece que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei e que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
E na senda desse princípio seguem outros, tais como o direito à segurança social. Diz a Constituição que todos têm direito à segurança social, incumbindo ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado. Outro direito plasmado na nossa Constituição é o direito à saúde, estipulando a Lei Fundamental que todos têm direito à proteção da saúde, através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito.
Outro princípio constitucionalmente consagrado é o direito ao ensino, com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso. Refere a Constituição que incumbe ao Estado assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito, criar um sistema público de educação pré-escolar e estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino. Para tal, deverá o Estado criar uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
Estes princípios consubstanciam o denominado "Estado Social", que apoia as famílias num sentido solidário. Acredito numa Segurança Social pública e para todos, de modo a continuar a desenvolver uma política social mais justa e solidária, em especial com os mais idosos e com as crianças, num serviço de saúde universal e tendencialmente gratuito e na escola pública, como regra, acessível a todos, como forma estruturante de criar igualdade de oportunidade para todos. Um Estado Social em que todos contribuem tendo em conta as suas reais possibilidades, sendo que quem mais tem contribui mais.
É fácil de ver que a destruição destes princípios fará com que as diferenças sociais se acentuem, pois quem pode pagar e tem possibilidades, irá para as melhores escolas privadas, terá a possibilidade de prosseguir estudos e sonhar com um melhor futuro, terá acesso aos melhores cuidados de saúde privados e aos melhores planos privados de reforma.
Os restantes serviços serão prestados pelos Estado, mas, inevitavelmente, resumir-se-ão ao mínimo, com menos verbas por parte do Estado e menos contribuições dos que mais tem, perdendo assim o seu valor e qualidade.
Estamos a assistir em Portugal à destruição do Estado Social, tal como está consagrado na Constituição. Ou estará a Constituição, e ainda o cumprimento das decisões do Tribunal Constitucional, simplesmente em suspenso? É porque se for esse o caso resta-nos perguntar: Constituição, para que serves?

Horta, 14 de janeiro de 2013

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Época de solidariedade

Artigo Tribuna das Ilhas (04/01/2013)
 
Acabámos de celebrar a festa da família, a época do ano em que nos sentimos mais próximos daqueles de quem mais gostamos e em que os nossos corações se enchem de sentimentos positivos, como a partilha, a gratidão, a amizade e a solidariedade.
Nesta altura, e tendo em atenção a difícil conjuntura mundial que atravessamos, a solidariedade dos que mais podem, a sua disponibilidade em auxiliar os que infelizmente atravessam dificuldades, revela-se de uma importância fulcral.
No Natal gostamos de dar. Gostamos de dar e receber em troca um sorriso. Posso afirmar com toda a certeza que um sorriso de uma criança que pouco tem é a melhor prenda que podemos receber. Um sorriso duma mãe mais aliviada por ter que pôr na mesa para os seus filhos na ceia de Natal reconforta-nos a alma.
Por isso digo, como gostaria que fosse sempre Natal! Porque nos nossos dias, as iniciativas de solidariedade que nesta altura proliferam não podem ser descuradas de futuro. Há famílias que precisam da nossa ajuda não apenas no Natal, mas durante todo o ano. Existem situações muito difíceis, em que ambos os membros do casal estão desempregados, e havendo crianças a situação torna-se verdadeiramente grave.
Estando no terreno às vezes deparamo-nos com situações deveras dramáticas que nos fazem pensar na justeza do mundo em que vivemos. Infelizmente as situações de desigualdade social agravam-se de dia para dia.
Mas acredito que, apesar das perspetivas não serem as melhores, devemos abraçar o novo Ano com uma esperança renovada. Esperança num Mundo melhor. Na despedida do ano velho desejamos sempre que o próximo seja melhor, cheio de sucessos, realizações e expetativas, que nos traga tudo o que queremos e que os nossos desejos se realizem.
Estas são por vezes palavras repetidas apenas por conveniência, sem verdadeira consciência do que queremos efetivamente dizer. Dada a situação difícil estas palavras, além de proferidas, devem ser efetivamente sentidas e devemos tentar dar o nosso melhor no dia-a-dia em prol de uma sociedade melhor, mais justa e solidária.
O homem, como ser social que é, deve interagir em sociedade duma forma integrada. Acredito que apenas uma sociedade com igualdade de oportunidades para todos criará e formará cidadãos preparados para o futuro, consciencializados que um pequeno gesto pode fazer a diferença. Que eu, tu, todos nós podemos ajudar a desenvolver uma sociedade melhor.
Sou por natureza uma pessoa otimista. Sei que os tempos são difíceis, e para alguns são mesmo extraordinariamente difíceis, mas que o espírito de fraternidade que por estes dias experienciamos se prolongue para o ano Novo, ajudando-nos a vencer os desafios que por aí vêm!
Um excelente 2013!

Horta, 31 de dezembro de 2012