Artigo
Tribuna das Ilha (18/01/2013)
Na Faculdade de Direito aprendemos que a Constituição da República
Portuguesa é a Lei Fundamental do País. Desde lá, até algum tempo atrás,
acreditei piamente nesse fato que me ensinaram.
Aprendi ainda que o
Tribunal Constitucional, tribunal ao qual compete administrar a justiça em
matérias de natureza jurídico-constitucional, estava no topo da nossa
hierarquia judicial, sendo que as suas decisões eram obrigatórias para todas as
entidades públicas e privadas, prevalecendo sobre as dos restantes tribunais e
de quaisquer outras autoridades, na sua qualidade de garante da Constituição.
No entanto, de há uns
tempos a esta parte, começo a ter sérias dúvidas quanto à veracidade desses
ensinamentos.
Um dos princípios fundamentais plasmados na nossa Constituição é o
princípio da igualdade, que estabelece que todos os cidadãos têm a mesma
dignidade social e são iguais perante a lei e que ninguém pode ser
privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento
de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de
origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação
económica, condição social ou orientação sexual.
E na senda desse princípio seguem outros, tais como o direito à
segurança social. Diz a Constituição que todos têm direito à segurança social,
incumbindo ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança
social unificado e descentralizado. Outro direito plasmado na nossa
Constituição é o direito à saúde, estipulando a Lei Fundamental que todos têm
direito à proteção da saúde, através de um serviço nacional de saúde universal
e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos,
tendencialmente gratuito.
Outro princípio constitucionalmente consagrado é o direito ao ensino,
com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso. Refere a
Constituição que incumbe ao Estado assegurar o ensino básico universal,
obrigatório e gratuito, criar um sistema público de educação pré-escolar e
estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino. Para
tal, deverá o Estado criar uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que
cubra as necessidades de toda a população.
Estes princípios consubstanciam o denominado "Estado Social",
que apoia as famílias num sentido solidário. Acredito numa Segurança Social
pública e para todos, de modo a continuar a desenvolver uma política social
mais justa e solidária, em especial com os mais idosos e com as crianças, num
serviço de saúde universal e tendencialmente gratuito e na escola pública, como
regra, acessível a todos, como forma estruturante de criar igualdade de
oportunidade para todos. Um Estado Social em que todos contribuem tendo em
conta as suas reais possibilidades, sendo que quem mais tem contribui mais.
É fácil de ver que a destruição destes princípios fará com que as
diferenças sociais se acentuem, pois quem pode pagar e tem possibilidades, irá
para as melhores escolas privadas, terá a possibilidade de prosseguir estudos e sonhar com um melhor
futuro, terá acesso aos melhores cuidados de saúde
privados e aos melhores planos privados de reforma.
Os restantes serviços serão prestados pelos Estado, mas,
inevitavelmente, resumir-se-ão ao mínimo, com menos verbas por parte do Estado
e menos contribuições dos que mais tem, perdendo assim o seu valor e qualidade.
Estamos a assistir em Portugal à destruição do Estado Social, tal como
está consagrado na Constituição. Ou estará a Constituição, e ainda o
cumprimento das decisões do Tribunal Constitucional, simplesmente em suspenso?
É porque se for esse o caso resta-nos perguntar: Constituição, para que serves?
Horta, 14 de janeiro de 2013