sexta-feira, 26 de abril de 2013

I.Solidariedade nacional II. Greve



 Artigo Tribuna das Ilhas (26/04/2013)
I.  Solidariedade nacional
No passado dia 14 de março o mau tempo que assolou a nossa Região, provocou nas ilhas de S. Miguel e da Terceira, danos irreparáveis, com a perda de vidas humanas, colocando os Açores novamente na rota das calamidades naturais às quais, infelizmente, não somos de todo alheios.
Os prejuízos materiais foram avultados, tendo sido contabilizados em cerca de 35 milhões de euros. Em resposta o governo da República aprovou uma resolução autorizando as autarquias açorianas a recorrerem ao endividamento para fazer face aos prejuízos das calamidades. A isto chama-se atirar areia para os olhos dos Açorianos, visto que, tal como afirmou o Governo Regional, 90% dos prejuízos estão na esfera de competência deste e não das câmaras municipais. Podemos afirmar em linguagem jurídica, que esta Resolução do Conselho de Ministros mais não é que letra morta, pura e simplesmente porque a sua aplicação não resolve a situação concreta.
A Lei de Finanças das Regiões Autónomas estabelece que “a solidariedade nacional vincula o Estado a apoiar as Regiões Autónomas em situações imprevistas resultantes de catástrofes naturais (… ). Estamos pois perante uma obrigação do Estado, ademais igualmente constitucionalmente consagrada, da qual o governo da República faz igualmente letra morta, ignorando a lei por completo e aumentando os exemplos de desresponsabilização para com a autonomia regional dos Açores por parte deste executivo.
Por cá felizmente todos os partidos políticos se uniram na defesa dos interesses dos Açorianos, repudiando esta atuação do governo da República.

II. Greve
Não há dúvida que sindicatos fortes, com capacidade de reivindicação dos direitos dos trabalhadores que representam, são peças essenciais na vida democrática duma sociedade. O direito laboral é uma matéria pela qual nutro uma grande afinidade e defenderei sempre a primazia dos direitos dos trabalhadores. No entanto, penso que para tudo na vida o limite é o bom senso.
A greve anunciada pela Sata é exatamente para os períodos em que ocorrerão o Sata Rally Açores e a festa do Senhor Santo Cristo dos Milagres na ilha de S. Miguel. No dia em que escrevo estas linhas, decorre o primeiro período da anunciada greve, apesar de ainda não sabermos quais os seus reais impactos. É preciso não esquecer que estamos perante períodos de excelência na dinamização da atividade económica regional, o que numa altura como a que atravessamos, devem ser abordados como se de ouro se tratasse.
O Sata Rally Açores, além da evidente dinamização local da economia, tem a mais-valia de levar o nome dos Açores além-fronteiras, pois é um evento com uma vasta cobertura internacional, de onde se destaca os diretos da EuroSport. Essa divulgação da nossa terra e das suas magníficas paisagens para uma audiência estimada de cerca de 200 milhões de telespetadores em dezenas de Países no Mundo, chegou a estar em causa devido à greve, mas, felizmente, essa situação foi ultrapassada.
Em relação ao Senhor Santo Cristo, estamos perante uma das maiores manifestações de fé das nossas gentes, evento que traz à ilha de S. Miguel milhares de emigrantes e seus descendentes. Ao verificar-se esta greve estamos a pôr em risco também a vinda desses emigrantes.
O setor do turismo, e todos os sectores correlacionados, precisam destes eventos como de pão para a boca e nenhum açoriano, que se afirme de princípio como tal, poderá olvidar o fato de esta greve poder acarretar consequências tenebrosas para toda a economia regional.
A tudo isto acrescem dois fatos de estrema relevância. Primeiro, a Sata é uma empresa pública com características especiais, regendo-se por obrigações de serviço público que não podem ser esquecidas. Segundo, as reivindicações dos trabalhadores, ao vingarem, fariam com que os trabalhadores da Sata, fossem os únicos trabalhadores do setor público que não sofreriam qualquer tipo de cortes nos seus rendimentos, o que traria uma clara vantagem em relação a todos os outros trabalhadores. A SATA não efetuou cortes nos vencimentos dos seus trabalhadores em 2011 e 2012, ao contrário do que aconteceu com os restantes trabalhadores do setor público, incluindo a TAP, que vai agora ser privatizada.
Repito, os direitos dos trabalhadores são sempre importantes, tal como o seu direito à greve, desde que seja tudo com peso e medida.

Horta, 23 de abril de 2013

sexta-feira, 12 de abril de 2013

É preciso dizer Não


 Artigo Tribuna das Ilhas (12/04/2013)

A semana passada foi a semana mais conturbada desde que o governo de Pedro Passos Coelho tomou posse. 
Primeiro, caiu o Ministro Relvas. Esta “cessação”, como o próprio a apelidou, foi um duro golpe para o Primeiro Ministro, pois Relvas era o seu braço direito. Este Ministro desde o início do seu mandato protagonizou uma série de tramas que pouco dignificaram o seu estatuto. O mais mediático terá sido o caso da sua suposta licenciatura por equivalência, que afinal se revelou não o ser, caso que foi entregue ao Ministério Público e estará na origem da sua saída do governo. Mas há mais. Suspeitas de pressões sobre jornalistas, suspeitas de ligações a espiões, suspeitas de favorecimento a amigos e uma série de falhanços governativos, faziam deste Ministro o mais fragilizado do governo. Diria mesmo que o Ministro Miguel Relvas resistiu até à última. Por muito menos se demitiram Ministros no passado. Agora sai, por fim, por falta de “força anímica”, nas palavras do mesmo.
No entanto, não sai sem deixar um “recadinho” ao Primeiro Ministro, dizendo no seu discurso final que foi pelo seu inigualável esforço que Pedro Passos Coelho, foi eleito presidente do partido e de seguida eleito Primeiro Ministro de Portugal. Nesse mesmo discurso consegue ainda elencar as coisas boas que fez durante o seu mandato. Foi um discurso ilusório de quem vê as coisas por uma perspetiva que não é, de todo, a dos Portugueses.
Segundo, e como já todos sabíamos, várias normas do Orçamento do Estado foram declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional (TC). O governo insistiu em medidas que já se sabia seriam declaradas inconstitucionais, pois já o tinham sido em relação ao Orçamento do ano passado. Estamos assim perante um governo que apresenta 2 anos seguidos orçamentos que contêm normas inconstitucionais.
E noutra intervenção ilusória, vem o Primeiro Ministro dizer que se estamos nesta situação devemo-lo à decisão do TC. Não Sr. Primeiro Ministro, esta situação deve-se à atuação do governo, não à decisão do TC. É que, mesmo que por vezes não se queira, vivemos numa democracia, em que pura e simplesmente não se pode colocar a Constituição em suspenso. Este ataque ao TC por parte do governo da República consubstancia um momento sem precedentes e lamentável da nossa vida democrática.
Disse, e muito bem, o Presidente do TC: “É o Orçamento do Estado que tem de se conformar à Constituição e não a Constituição que tem de se conformar ao Orçamento do Estado!” Não poderia ser mais percetível esta afirmação. 
Mal andou também o Sr. Presidente da República que perante um Orçamento que sabia conter normas inconstitucionais, não pediu a fiscalização preventiva do mesmo, o que fez apenas protelar uma decisão que, todos sabíamos, seria a que veio a público. Vem agora, em comunicado na página da Presidência da República, afirmar que este governo “dispõe de condições para cumprir o seu mandato democrático”. Este é o governo que, fruto das suas políticas e do caminho da "austeridade custe o que custar", fez com que a dívida pública crescesse de forma perigosa (93,5% em 2010 e 123,7% em 2012), que o desemprego aumentasse desmesuradamente (10,8% em 2010 e 15,7% em 2012), que a economia esteja a caminhar para o seu terceiro ano de recessão (PIB +1,9% em 2010 e -3,2% em 2012), com previsões para 2013 catastróficas (mais que o dobro da quebra do PIB prevista e trimestres com 19% de desemprego), insistindo sempre no mesmo caminho. Este é o governo que, acima disso tudo, apresentou ainda 2 orçamentos inconstitucionais. Um governo que, para além de já ter sido alvo de moções de censura de todos os partidos da oposição, conta também com uma forte censura do Povo Português.
Como Paul Krugman (prémio nobel da economia) escreveu nas redes sociais, depois de ouvir a explicação do Primeiro Ministro: "É preciso dizer Não!"


Horta, 9 de abril de 2013