sexta-feira, 4 de maio de 2012

Sacudir a água do capote


(Artigo Tribuna das Ilhas - 04/05/2012)
A autonomia regional é consequência do 25 de Abril. Na sequência da Revolução dos Cravos, Portugal entra finalmente num regime democrático e é aprovada a Constituição da República Portuguesa (CRP).
Os povos insulares, designadamente os Açorianos, há muito que almejavam a autonomia e finalmente ela foi consagrada em 1976 na CRP. Hoje podemos dizer que as autonomias regionais fazem a República Portuguesa mais completa e são um exemplo do que se pretende com o regime democrático.
Os objetivos da autonomia regional são a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses regionais, mas também o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses.
A autonomia regional é política, legislativa, administrativa, financeira e patrimonial, mas deve ser exercida numa lógica de solidariedade. Existem matérias importantes na Região cuja responsabilidade pertence à República. E obviamente tem de ser assim. Cabe aos órgãos da república assegurarem, sempre em cooperação com os órgãos de governo próprio, o desenvolvimento económico e social das regiões autónomas, visando, a correção das desigualdades derivadas da insularidade. Estas competências estão consagradas constitucionalmente.
No entanto, podemos ver hoje, que este poder instalado na República, tudo faz para sacudir a água do capote quando toca às suas responsabilidades perante as autonomias.
São variados os exemplos de tentativa de fuga às responsabilidades por parte do governo de Passos Coelho: são os aeroportos, as obrigações de serviço público, a RTP-Açores, a Universidade dos Açores ou as recentes declarações do Ministro da Economia, que veio sustentar ser da competência da Região Autónoma dos Açores suportar os custos da formação dos efetivos da PSP no arquipélago. Está em marcha uma estratégia que não olha a meios, e até quer descriminar os doentes Açorianos que são deslocados para o continente, por não terem alternativa na sua Região, como se fossem Portugueses de segunda.
Cada um tem de assumir as suas responsabilidades. O que cabe aos órgãos de governo próprio é sua função. O que cabe aos órgãos da República tem de ser assumido por estes! Os Açorianos não podem deixar que lhes deitem areia para os olhos. Ao Governo neo-liberal de Passos Coelho já não basta ser mais troikista que a Troika, quer ainda fazer impender sobre os Açorianos responsabilidades que são, por lei, suas!
Na semana seguinte a comemorarmos mais uma vez o Dia da Liberdade, que tanta celeuma levantou este ano, com os Capitães de Abril e, em solidariedade com eles, também, grandes nomes da nossa história política a se recusarem a participar nas cerimónias oficiais de celebração, penso que os valores do 25 de Abril têm de ser, mais que nunca, preservados e defendidos.
O povo não pode baixar a cabeça a tudo, os Açorianos devem ter consciência de quem os realmente defende. De quem no passado já deu provas de colocar os Açores à frente de partidos, de quem não hesitou, um minuto que fosse, na defesa dos nossos direitos, mesmo que para isso tenha ido contra o que defendia o seu partido na República.
Na nossa Região há pessoas, que para defenderem o seu partido na República, que agora até está no poder, concordam com o líder em tudo, mesmo quando isso vai contra os Açorianos. Os Açores têm de estar sempre à frente de qualquer partidarismo. Porque acreditamos nos valores de Abril, mas principalmente porque acreditamos na autonomia regional e nos Açores, não vamos baixar os braços! Não podemos assistir calados a este vergonhoso sacudir de água...

Horta, 29 de abril de 2012

4 comentários:

  1. Interessante ouvir utilizar a expressão neo-liberal como um insulto tão pouco tempo depois do Governo de José Sócrates e, em relação a troika, foram e são três os partidos que apoiam esse rumo.
    Tendo em conta o que são as verdadeiras posições do PS, o título "sacudir a água do capote" é muito mais adequado do que se calhar a autora previa...

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  2. Caro Tiago,
    Antes de mais obrigado pelo feedback.
    A expressão neo-liberal não foi utilizada de forma insultuosa, mas para caracterizar as políticas do actual governo.
    Parece-me que nunca como agora, se consegue ver bem as claras diferenças entre PS e PSD. Efetivamente o PS aprovou o acordo com a troika, mas não as novas medidas aplicadas pelo governo de Passos Coelho e que vão muito além do acordado com a troika.
    A utilização da expressão "sacudir água de capote" foi bem pensada caro Tiago ;) A mesma refere-se à desresponsabilização do Governo da República quanto às Autonomias Regionais. Esta é a minha posição, que será sempre a mesma seja qual for o Governo na República.

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  3. O feedback é dado com todo o gosto pois, embora seja raro concordar, leio-te sempre com prazer.

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  4. Agradeço e retribuo as tuas palavras. :)

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